quinta-feira, 29 de março de 2012

A Forja de Zandru - trecho 39

Autor: Marion Zimmer Bradley e Deborah J. Ross
Tradução: Gisele Conti


...

Uma melodia se formou no fundo de sua mente, uma canção subindo e descendo como as gentis ondas de um rio. Varzil imaginou-se deitado em um barco, como o que tinha quando criança, sendo levado ao longo do rio, observando os galhos que passavam acima de sua cabeça, a hipnótica alternância da sombra e do brilho radiante. Sem saber se em uma hora ou em um instante depois, ele notou outros barcos, todos estranhamente translúcidos agora, pairando ao seu lado. Tão hábil quanto um mestre tecelão, Auster reuniu seu círculo.
Varzil nunca fizera parte de um verdadeiro círculo antes. Tocara outras mentes como parte dos exercícios de treinamento, e depois apenas de seu professor, ou de mais um ou dois outros. Nunca imaginara nada como esta graça flutuante. Cada mente corria no mesmo rio, criando a mesma deliciosa harmonia, e ainda assim mantendo sua individualidade única. Havia Cerriana, com todo seu cabelo vermelho e temperamento ardente como uma jóia esverdeada, Fidelis uma melodia familiar tocada em um chifre tão fundo e rico que tocava até os ossos, Lerrys uma estranha, mas arrebatadora batida de asas, cinza como as de um falcão... e os outros, cada um com sua própria assinatura.
E finalmente havia Eduin. Varzil evitou direcionar sua atenção para ele até o final, esperando a barreira opaca que avistara no pomar. Para sua surpresa, não encontrou um campo liso e espelhado. Eduin brilhava como uma rede intrincada de jóias todas unidas por um fio prata, tudo girando e se alternando. Apesar da beleza e força surgindo através da estrutura, Varzil se retirou logo depois. Não podia ver mais do que uma fração daquilo de cada vez, e algo no movimento, a onda de luz e poder, o perturbava. Talvez fosse por sua experiência limitada, disse a si mesmo, por nunca haver experimentado uma mente tão diferente quanto esta.
Mesmo assim Auster tinha, tranqüila e habilmente, tecido a assinatura de laran de Eduin na mesma unidade dos outros. Era isso que significava ser um Guardião... aceitar o Dom de cada pessoa exatamente como era, criando harmonia e sentido sem causar nenhuma mudança?
Varzil teve pouco tempo para gastar com tais devaneios enquanto o trabalho começava. Sob a firme orientação mental de Auster, o grupo concentrou suas energias, doando-as livremente ao seu controle. Fidelis e Cerriana trabalhavam em uníssono para identificar as áreas de maior patologia em cada paciente. Varzil se maravilhava com a delicadeza da manipulação de células mortas, o vai e volta das energias vitais enquanto uma ou outra das crianças doentes pulava da febre constante para o sono de cura.
Quanto tempo isso durou, não podia dizer. Perdeu toda a sensação de tempo, suspenso nas águas correntes do círculo de Auster. Algumas vezes ele boiava, sorvendo aquilo tudo, suspenso em um oceano de um cinza prateado respingado com luz colorida. Mas cada vez mais, ele se tornava parte da própria teia, passando a energia que fluía de si mesmo, através da hábil orientação psíquica de Auster, e para dentro dos corpos danificados dos pacientes.
Algumas vezes, ele sentia a presença dos outros na teia. Mesmo Eduin começou a parecer familiar. Uma hora alguém o tocou... um arrepio através de seu corpo mental, o que percebeu representar o contato físico real. O sussurro agradável de Cerriana tocou seus pensamentos.
Respire mais fundo.
Obedecendo automaticamente, seu peito subiu e seus pulmões se encheram. Embora não pudesse ver com seus olhos materiais, ele sentiu o sorriso em resposta de Cerriana. Sua voz desapareceu como gostas de água colorida em uma poça imóvel. A luz cinza escureceu, não a escuridão física aflitiva, mas uma libertação gradual do círculo.
- Varzil.
Ele piscou, surpreso ao se encontrar sentado, imóvel, em um banco. Por um momento, não reconheceu seu próprio nome.


continua...

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