Autores: Marion Zimmer Bradley e Mercedes Lackey
Tradução: André Pereira
Tradução: André Pereira
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Quem, ou o quê, poderiam ser esses habitantes? Talvez fosse uma cultura indígena pré-espacial, e nesse caso provavelmente não haveria sinais de civilização visíveis de órbita, ao menos não sem que o céu se encontrasse muito limpo, para que os telescópios óticos pudessem atravessar.
Podia até ser uma colônia perdida, fundada por uma das Naves Perdidas, anteriores ao Império. Isso seria fascinante, embora Ysaye não soubesse de nenhuma tão distante.
Mesmo assim, ela disse a si mesma. Só por que ninguém encontrou nenhuma... bom, talvez fosse por que ninguém procurou no lugar certo.
Uma colônia perdida havia sido encontrada ano passado, e algumas Naves Perdidas mais antigas pareciam ter chegado espantosamente longe, as espaçonaves que foram lançadas alguns milhares de anos atrás, antes dos terráqueos aprenderem a construir naves com rastreadores. As naves perdidas depois disso eram recolhidas dentro de poucos anos. De modo que se fosse uma colônia proveniente de uma Nave Perdida, certamente seria muito antiga, por conta própria desde muito antes do Império.
Por outro lado, mesmo se seu pressentimento estivesse errado, e o lugar fosse desabitado – não que realmente achasse que era, mas até obter uma evidência decisiva, era uma boa idéia considerar todas as possibilidades – era uma boa localização para um espaçoporto de ponto de transferência, próximo do lugar em que os braços espirais da galáxia se encontravam, mais ou menos um bilhão de quilômetros. Assim, caso o planeta fosse habitável, se David e Elizabeth estivessem dispostos a exercer suas especialidades secundárias ao invés das primarias, haveria trabalho o suficiente para a vida inteira, desde que os manda-chuvas decretassem que tal espaçoporto fosse construído ali.
O carrilhão para a troca de turno soou no exato momento em que o técnico-chefe do turno seguinte avançava com facilidade através da rampa gravitacional para o terminal do console. Ysaye desconectou, ele conectou, e ela saiu da sala do computador.
Ao percorrer o corredor descobriu-se esticando músculos doloridos, e per-cebeu que seus ombros, braços e mãos estavam com câimbras e rígidos. Obvia-mente passara mais tempo enredada com pequenos e meticulosos ajustes no núcleo do que percebera. Decidiu passear um pouco antes de ir para o quarto.
Ao passar pela porta escrita “Ponte de Observação” ela decidiu entrar.
– Veio dar uma olhada no nosso novo sistema? – o rapaz indagou quando ela entrou. Era um membro da tripulação científica, Ysaye sabia, de maneira que ele não permaneceria no planeta, a menos que decidissem construir um espaço-porto. Sua tarefa atual era analisar o planeta o máximo possível antes da aterrissagem – e naquele momento todas as informações vinham da sonda. – obrigado por encontrar a irregularidade, Ysaye, estava deixando todos nós loucos – ele continuou. – Isto é, mais loucos.
Ela balançou a cabeça.
– Não foi nada especial. Se eu não tivesse encontrado, outra pessoa teria.
O rapaz lhe endereçou um olhar cético, mas não fez nenhum comentário.
– Suponho que saiba que pelo menos um é habitável – ele continuou –, o quarto. O quinto talvez, mas dificilmente; ele se encontra quase completamente congelado; calotas de gelo o ano inteiro, e a duração do ano é de cinco anos padrões. Mas o quarto só está à margem de habitabilidade; o clima é bastante hostil, mas formas de vida baseadas em carbono podem viver lá. Nenhum grande mar, um continente. Eu não gostaria de viver lá, e duvido que você gostasse; é frio feito o inferno de Dante. Mas definitivamente está dentro dos limites.
– Nada mal, Haldane – disse Ysaye, depois riu. – Ensaiando o relatório para o capitão?
– Adivinhou – John Haldane respondeu, animado. – Ah, eu mencionei que o planeta tem quatro luas, cada uma de uma cor diferente?
Ela balançou a cabeça para o rapaz, e estalou a língua em reprovação.
– Não, você esqueceu isso; precisa organizar melhor o seu material. Quatro luas não é um recorde para um planeta desse tamanho?
Ele fez que sim, parte da atenção no console.
– Talvez você tenha razão; se um planeta possui mais do que isso, normal-mente é um grande gasoso, e as luas têm a aparência de planetas. Como Júpiter no velho sistema solar. Eu esqueci quantas luas finalmente decidiram que tinha; parecia capturar qualquer coisa que se aproximava. Mas havia pelo menos onze dos maiores.
Ysaye espreitou a tela. O objeto de toda a atenção parecia singularmente desinteressante a essa distância.
– Quatro luas. Como é possível?
Haldane encolheu os ombros.
– Quem sabe? Não é a minha especialidade. Creio que o Mundo de Bettmar tem cinco, mas há um limite: a massa das luas combinadas precisa ser menor que a do planeta para ser habitável. Normalmente menos que um quinto do seu peso combinado. Também há um limite para o tamanho; se for muito pequeno, elas escapam da primária e se tornam asteróides. – Ele gesticulou para o visor. – A branca é exatamente do tamanho mínimo.
– Elizabeth estava falando alguma coisa sobre a quantidade de temas para baladas que haveria em um planeta com quatro luas – Ysaye comentou.
Haldane ajustou o foco e a lua branca ficou bem clara na tela.
– Em suposição, eu diria que elas devem fazer coisas estranhas com a mitologia nativa, isto é, se é que existem nativos. Com quatro luas, eu diria que o conceito de monoteísmo não teria muita possibilidade de ocorrer! A vista deve ser formidável da superfície do planeta... todas com cores diferentes. Nunca vi nada parecido antes. Definitivamente anômalo.
Ysaye estreitou os olhos, tentando discernir mais detalhes do planeta, mas se tratava de um enigma encoberto por nuvens.
– Elas realmente têm cores diferentes, ou é só um efeito do sol que lhes dá essa aparência?
Haldane balançou a cabeça.
– Seu palpite é tão bom quanto o meu; eu nunca vi nada parecido... mas eu já disse isso. Mas sei uma coisa – ele acrescentou. – Aposto que, não importa o quanto os nativos sejam avançados, elas ainda representam um papel substancial em qualquer religião que eles possam ter. É o que sempre acontece com as luas.
– Você sabe se vamos aterrissar em alguma delas?
– Provavelmente vamos querer uma estação meteorológica em uma delas. Seria o primeiro passo, em qualquer caso. E, se for uma cultura aborígine pré-espacial, isso é praticamente tudo que podemos fazer; observar o clima. Não teríamos permissão para afetar nada do que eles fazem; sociedades primitivas têm de evoluir à sua própria maneira.
– Se houver uma cultura lá, só aterrissar no planeta os afetará – comentou Ysaye.
– Tem razão – disse Haldane jovialmente –, mas o que nós fizermos antes de providenciar uma avaliação oficial não conta. Deus do céu! Dá uma olhada nisso! – Ele se interrompeu de repente, mexendo nos instrumentos. – Não, não dá para aproximar o foco, droga... as nuvens lá embaixo são formidáveis.
– O que é? – Ysaye debruçou-se sobre o ombro de Haldane para olhar melhor. – Algum sinal de vida? Um sinal luminoso escrito “Olá, estamos aqui, venham nos buscar”? – Como ele não respondesse, ela acrescentou, irreverente: – Uma gigantesca placa publicitária alienígena?
– Nada tão preciso. Tem o efeito da Grande Muralha da China... mas naquele caso era uma estrutura criada deliberadamente. Creio que este é uma formação natural.
– Como o quê? Que espécie de formação seria grande o suficiente para ser avistada dessa distância? A sonda nem está em órbita ainda!
– Uma geleira, maior do que qualquer geleira das idades glaciais da Terra, estendendo-se por metade do planeta. Uma muralha ao redor do mundo.
Uma muralha ao redor do mundo? Isso sem dúvida estimulava o seu interes-se.
– Quem poderia tê-la construído?
– Ninguém; é um fenômeno natural – ele disse positivamente.
– Uma formação natural? – ela contestou em tom cético.
– Por que não? A Grande Muralha da Terra pode ser avistada, sob a devida amplificação, da lua. Houve até alguma discussão a respeito da possibilidade de a Grande Muralha da China ter sido feita assim de propósito, e que eventual-mente a sociedade que a construiu definhou à pré-tecnologia... ou seria pós-tecnologia?
– De qualquer maneira – Ysaye disse repressivamente – eu não o aconselha-ria a discorrer essa teoria em particular para o capitão. Você não ouviu seu discurso padrão sobre a pseudociência das psicocerâmicas?
– Várias vezes – admitiu Haldane, se encolhendo. – Pois muito bem; embora eu ache que se trate de uma geleira natural, dado o clima terrível, não posso afirmar que é uma geleira natural, feita por seres inteligentes residentes, ou abandonada por uma prévia ou visitante sociedade de seres inteligentes. Por tudo o que sei, pode ser o equivalente de um projeto científico escolar para o proverbial homenzinho verde. Ou mesmo um projeto artístico.
– Certo, chega de teorias – Ysaye riu. – Algum sinal de excursões em alguma das luas?
Ele balançou a cabeça.
– Nada evidente. Nada que a sonda possa detectar, de qualquer maneira. Nós deixamos pegadas e lixo sortido na nossa, mas é cedo demais para falar alguma coisa sobre essas. Se nós procurarmos com empenho, talvez encontremos uma lata de cerveja ou coisa do tipo, e isso é uma espécie de prova. Ah, olhe! As nuvens estão limpando!
Ele mexeu em seus instrumentos até a geleira aparecer bem centralizada no mostrador.
– Pelo menos servirá como marco de aterrissagem, embora o terreno provavelmente seja muito irregular e montanhoso. Há um conteúdo de oxigênio maior que o normal, de modo que o super-Himalaia ainda seria escalável, acredite ou não. Caso você goste dessas coisas. Pessoalmente, penso que se Deus quisesse que escalássemos montanhas, teria nos dados cascos e escavadores ao invés de mãos e pés.
– Escalável pelo quê? – Ysaye perguntou, em dúvida. – Você acha que o planeta é habitado?
continua ...
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