Autor: Marion Zimmer Bradley e Deborah J. Ross Tradução: Gisele Conti
3 Nos aposentos dos Ridenow na Cidade Oculta de Arilinn, Varzil esperou pelo retorno de seu pai. Cada casa grande tinha acesso a aposentos particulares, limpos e aconchegantes, mas austeros. Apesar do estandarte verde e dourado, eram apenas levemente mais luxuosos do que abrigos de viajantes, e eram mantidos sob as mesmas condições de trégua. Há menos de duas horas antes, Dom Felix tinha sido convocado, com acentuada educação, mas como absoluta ordem, pelo Guardião da Torre Arilinn. Então ele notaria que Varzil havia escapado da reunião noturna do Conselho Comyn, onde sua presença representaria sua família, e ficara fora a noite toda sem permissão ou sem avisar a ninguém onde estava. Dom Felix nunca teria aprovado seu plano, então ele na verdade havia feito tudo o que seria proibido de fazer. Agora Varzil seria descoberto, seu ato de desobediência se tornaria público. Se pelo menos Arilinn o tivesse aceitado... mas não havia, e agora ele pagaria em dobro, por tentar e por falhar. O resultado não seria muito prazeroso. Varzil esperou o retorno de seu pai com tranqüilidade, pois sempre aceitara os castigos pelas travessuras de infância com paciência. Nenhuma ação, grande ou trivial, ficava sem conseqüência. Em Água Doce, a propriedade da família, ele via isso diariamente. Uma semente plantada com cuidado tornava-se uma videira carregada com uvas doces no outono. Uma mão erguida com raiva contra um potro destreinado resultava em uma montaria rebelde. Um gato cuja cauda foi puxada se viraria e arranharia quem a puxou. Uma palavra gentil e um sorriso ao cozinheiro resultaria em um agrado na hora de dormir. Uma tarde de verão nos orquidários, tocando flauta e observando o formato das nuvens, era seguido por horas extras de treinamento com espadas de madeira. Enquanto sentia a aproximação de seu pai, Varzil se preparava para a ladainha usual. Podia até recitar para si mesmo: “Quando irá tirar a cabeça das nuvens e prestará atenção? Eu o trago até Arilinn para a mais solene ocasião e você sai correndo em alguma diversão irresponsável! Você sabe o quanto o Conselho Comyn é importante... sua influência, sua política. Nós Ridenow precisamos de alianças poderosas, por tratado ou casamento, e é ali que elas são forjadas! Você nos fez de palhaços com sua brincadeira impensada!”. Dom Felix abriu a porta para a sala de estar central. Varzil ergueu-se e envolveu-se com os braços. Com um rápido olhar, notou a expressão de seu pai, as sobrancelhas escuras juntas e a testa vincada por linhas incisivas. A agitação de seu pai alcançou Varzil em uma turbulência de som e cor. Dom Felix desamarrou seu manto e colocou-o sobre a cadeira mais próxima. Nenhum servo se aproximou para pegar a vestimenta, pois como na própria Torre, apenas aqueles de puro sangue Comyn podia entrar na Cidade Oculta. - Sabe que não aprovo o que fez, correr para a Torre daquele jeito, - Dom Felix começou sem rodeios. Andando de um lado para o outro, batia em uma mão com o punho da outra. - Mas aqueles... usadores-de-sandálias bastardos tiveram a afronta de me questionar... eu!... como se eu fosse um ninguém! Recusei-me a dar-lhes qualquer satisfação, é claro. Podem pegar suas suspeitas e enfiá-las no traseiro congelado de Zandru! Dom Felix chegou ao extremo da sala e de seu fôlego ao mesmo tempo. Ele parou, visivelmente se controlando, e virou-se para seu filho. - Ah, tudo bem, tudo aquilo não importa mais. Nós acabamos com eles. Agora venha, temos preparações a fazer. Pretendo estar na estrada para casa antes da primeira luz da manhã. - Jogando o manto sobre um ombro, ele foi à direção dos aposentos de dormir. Varzil permaneceu onde estava. Seu coração martelava contra a cavidade de seu peito magro. Suor escorria de sua testa. Seus joelhos tremiam. Se desistisse agora, poderia nunca mais ter outra chance. Mesmo a menor esperança de ser capaz de dissuadir o Guardião através da pura persistência e paciência era melhor do que nada. continua...
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