Autor: Marion Zimmer Bradley e Deborah J. Ross
Tradução: Gisele Conti
...
Dois homens em vestes e calças de lã de pastores estavam agachados próximos ao topo da colina, um deles segurando o braço. Algo molhado escorria através de seus dedos.
A luz vermelha do sol poente se refletia nas espadas erguidas… lâminas retas de homens ainda ansiosos pela chance de usar suas armas... lâminas curvas menores nas mãos das ágeis criaturas peludas. Os homens-gato lutavam para acobertar sua retirada enquanto empurravam uma dúzia de aterrorizadas ovelhas ao longo da fenda.
Um homem com uma barba negra tropeçou quando a rocha rolou sob seus pés. Um homem-gato correu até ele, espada curva em movimento. O homem virou-se um instante antes que a lâmina abrisse seu abdômen.
Enquanto o homem-gato recuperava seu próprio equilíbrio, um segundo homem jogou-se ao lado do primeiro. Sua aproximação tirou-o do alcance da espada do homem-gato. Invertendo sua lâmina com uma velocidade inumana, o felino atacou novamente. A ponta rasgou a coxa do homem.
Varzil sentiu o grito do homem como um calafrio em sua própria pele. Com seu suspiro seguinte, sentiu o gosto cobre de sangue.
Em um instante, os homens-gato vieram fervilhando novamente. Eles se moviam através das sombras com uma graça mortal. Talvez farejassem uma inesperada vitória.
O terror agora mascarava as imagens. Varzil não mais conseguia ver a encosta claramente, mas ainda sentia cada golpe, cada investida, cada respiração. O aroma almiscarado dos homens-gato o envolvia. Adrenalina pairava amarga no ar gélido da noite.
Varzil estremeceu, voltando a si. Apenas um instante se passara, apenas uma frase ou duas de conversação. Ainda as imagens queimavam dentro dele, tão vívidas como se estivesse naquela encosta sob o sol poente enquanto Carlo terminava seu relato, olhando para Varzil com uma expressão curiosa e penetrante.
- E os outros dois homens? - Dom Felix perguntou em uma voz áspera. Varzil nunca vira tanto medo em seu pai.
- Depois que a batalha acabou e os homens-gato fugiram, dois pastores trouxeram os corpos dos homens assassinados de volta a Água-Doce. Seu filho e o outro homem não estavam mais com eles.
- Os homens-gato os levaram? - Felix perguntou, incrédulo.
- Talvez, ou fugiram e ainda estão vivos, feridos em algum esconderijo. - Carlo disse. - A leronis de sua propriedade não pôde alcançar a mente de seu filho, nem de seus parentes em Serrais.
- Devo voltar logo de uma vez! - Felix berrou, voltando em direção aos cavalos. Então parou, com a enorme distância impressa em sua face. Não restara nenhum cavalo em pé, nem mesmo o magnífico negro que Carlo montava tão bem, que cobria vários quilômetros em menos de dez dias. Neste momento, Harald podia estar morto ou, na melhor das hipóteses, com a trilha já encoberta.
Varzil pegou um lampejo de emoção de Carlo. O jovem de cabelo vermelho inclinou-se novamente para Dom Felix.
- Se não se importar em voltar para Arilinn comigo, - Carlo disse, - um carro-aéreo será colocado à sua disposição. Com sorte e um céu claro, pode chegar a Água-Doce nesta mesma noite.
Varzil prendeu o fôlego à generosidade da oferta. Carros-aéreos impulsionados por laran eram extremamente caros de ter e operar, um luxo restrito a reis e aos mais abastados. Carros-aéreos dependiam da tecnologia desenvolvida na Era do Caos, muitas delas já perdidas. Mesmo agora, poucos eram usados senão em batalha e a maioria se quebravam. Auster teria usado sua influência como Guardião para conseguir um... e por que ele ajudaria alguém que mal conhece?
- Quem arranjou isso? - Dom Felix disse de cara fechada. - E quanto irá me custar?
- O proprietário deseja permanecer anônimo, por razões que você certamente deve compreender, - Carlo disse. - E não há nenhum preço. Apenas um conselho. Há espaço para três passageiros. Você não teria melhor escolha do que seu filho mais novo.
- Varzil? - Ele não é nenhum rastreador, nem tem nenhuma grande habilidade com uma espada. E se uma leronis treinada não pôde alcançar Harald com sua mente, o que esse pivete pode fazer?
Dom Felix fez um resmungo com a garganta. Ele claramente não queria recusar uma oferta tão generosa ou ganhar um inimigo tão poderoso com uma recusa mal-educada. Varzil quase ouviu os pensamentos na mente de seu pai. O importante era alcançar Água Doce o mais cedo possível, avaliar a situação, e agir rapidamente. Se isso significava arrastar consigo seu inútil filho mais novo, esse seria um pequeno preço a pagar.
...continua
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