sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A Senhora do Trilio - Trecho 5

Autor: Marion Zimmer Bradley
Tradução: Ariane Pierine


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Informações sobre a terra eram acessíveis para Haramis como as batidas do seu coração. Era muito mais difícil obter informações sobre as pessoas. Passaram várias semanas antes de Ayah, serva nyssomu do palácio, receber a mensagem da arquimaga, conseguir uma licença para visitar a irmã, e afastar-se bastante da cidadela de forma que um abutre gigante pudesse pegá-la sem ser visto. Ninguém da família real sabia que a irmã de Ayah trabalhava para a arquimaga, e Haramis queria manter as coisas desse jeito.
Um abutre finalmente chegou à torre com uma nyssomu bem embrulhada nas costas. Haramis saiu para receber o pássaro e carregou a pequena mulher para dentro no colo. O principal problema de morar onde morava era que seus servos nyssomus não podiam sair em segurança. Mesmo depois de quase duzentos anos, Haramis ainda lembrava vivamente do dia em que seu amigo e companheiro Uzun quase morreu congelado quando procuravam seu talismã. Ela perdeu um dia inteiro de viagem retornando para um ponto de menor altitude para reaquecer Uzun, antes de enviá-lo de volta para as terras baixas e continuar a viagem sozinha. Os vispis eram os únicos oddlings que podiam sobreviver nas montanhas, e até eles preferiam viver em pequenos vales isolados, aquecidos por fontes de água quente.
Então Haramis carregou o embrulho bem enrolado para dentro da torre e entregou a hóspede para Enya, irmã da visitante, para levá-la para seu quarto e dar-lhe de comer depois da viagem. O que Haramis queria saber tinha demorado esse tempo todo para chegar. Podia aguardar mais algumas horas.



Quando as três se reuniram no estúdio de Haramis, bebendo suco de ladu quente em canecas, Haramis perguntou a Ayah sobre as crianças da visão.
- A princesa Mikayla e lorde Fiolon? – perguntou a oddling surpresa.
Ela obviamente ficou imaginando que interesse Haramis podia ter nas duas crianças, mas Haramis achou melhor não explicar, pelo menos não naquele momento. Simplesmente esperou até a mulher continuar.
- Mika, a princesa Mikayla, é a sexta dos sete filhos do rei. O rei se concentra na educação do seu herdeiro. A rainha se preocupa com o “bebê”, que hoje tem dez anos, e os outros quatro têm idades muito próximas, e costumam andar juntos – a mulher oddling balançou a cabeça. – Por isso ninguém liga para o que Mika faz, e os pais de Fiolon estão mortos, ou pelo menos a mãe dele está. Se não tivessem um ao outro, ela poderia ser uma criança muito solitária, e acho que ele também.
Haramis pensou no que ela dizia.
- Sempre tive Uzun como meu melhor amigo – ela disse, sorrindo e olhando com carinho para uma harpa de madeira polida com uma incrustação de osso no topo da coluna, que estava ao lado da sua cadeira. Passou a mão no instrumento como se acariciasse um animal de estimação. – Mesmo assim, não consigo imaginar como seria minha infância sem as minhas irmãs. Elas estavam sempre lá, querendo ou não – ela trouxe o pensamento de volta para o presente. – Então como é que Fiolon se encaixa? Quem é ele, exatamente?
Ayah continuou seu relatório.
- Lorde Fiolon de Var. A mãe dele era a irmã mais nova do Rei de Var; nossa rainha é a do meio. A mãe de Fiolon morreu quando ele nasceu, mas passaram-se seis anos antes da nossa rainha persuadir o rei a permitir que ela criasse o filho da irmã falecida.
- E o pai de Fiolon? – Haramis estava curiosa para saber isso desde o momento que ouviu a conversa das crianças.
Ayah deu de ombros.
- Ninguém sabe. A mãe dele não era casada.
Haramis fez cara de espanto.
- A irmã do Rei de Var teve um filho, e ninguém tem a menor idéia de quem é o pai? Dada a falta de privacidade em qualquer palácio que eu conheço, isso parece incrível. Alguém deve ao menos suspeitar de quem era seu amante.
- Segundo os boatos ela morreu afirmando que um dos Senhores do Ar era o pai de seu filho.
Haramis ergueu as sobrancelhas, surpresa.
- Jamais soube que os Senhores do Ar assumissem forma física, menos ainda que gerassem filhos.
Ayah suspirou.
- Ela estava morrendo, Senhora, e provavelmente delirava. Mas eu concordo, é estranho que ninguém saiba quem é o pai dele. Muito estranho.
Haramis deu de ombros.
- Duvido que isso tenha importância. Toda família numerosa tem crianças extras. Mikayla e ele estão comprometidos?
Ayah balançou a cabeça.
- Existem boatos – Mikayla se encaixa na sua categoria de extra também, até onde é permitido a qualquer princesa, mas não existe um contrato formal. Creio que pode até ser bom. Eles gostam muito um do outro.
- É uma pena – disse Haramis. – Já que Mikayla será a próxima arquimaga, ela terá que desistir dele.
O queixo de Ayah caiu.
- Mika? A arquimaga? – Ela hesitou um longo momento antes de continuar a falar. – Senhora de Branco, eu realmente acho que ela não vai gostar disso.
- Não importa se ela gosta ou não – disse Haramis calmamente. – Ninguém é voluntário para essa vida. É o destino dela, como foi o meu.

continua....

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